O que alguém em si não pode
nem nos outros emendar,
deve (que Deus sempre acode)
paciente suportar.
Até que, doutra maneira,
praza Deus, até o fim
guarde paciência inteira,
verá que é melhor assim.
A paciência se revela
e exerce na provação;
nossos méritos sem ela
pouca vália terão.
Sofrer aproveita a gente,
roga, contudo, ao Senhor
que te ampare e acalente
para aguentares a dor.
Como alguém que tendo sido
primeira e segunda vez,
com razão repreendido,
recai nos erros que fez,
Não contendas, mas na graça
de Deus tem fé, para que
sua vontade se faça,
deixa-lhe tudo a merce.
Ele o bem em mal converte
-- Que em todos os servos seus
desejo infindo desperte
de honrar o nome de Deus
Aprende a sofrer paciente
dos outros qualquer señão
ou fraqueza, que igualmente
teus defeitos muitos são.
Tolerância tais defeitos
precisam também pedir:
Aos outros queres perfeitos,
sem nada em ti corrigir!
Fazer-se tal qual entende
Não pode o homem jamais,
Como, pois, torcer pretende
a seu talante, os demais?
Queremos que os outros tenham
a punição mais atroz
E, mesmo justas não caiam
as punições sobre nós.
Quão nos outros, desagrada
Larga licença! E a ambição
de tudo temos! Em nada
Nos compraz a negação.
Estrito regulamento
quem nos derá aos mais impor
e leve constrangimento
produz-nos tanto furor.
Disto resulta bem claro
que neste triste lugar,
Ao nosso próximo é raro
como a nós mesmos amar!
Si todos aqui, sem custo
chegassem a perfeição,
por vosso amor oh Deus Justo
que sofreramos então?
Ciência profunda e larga
a providência ordenou:
Suporte este agora a carga
que o outro ja suportou.
Defeitos de toda casta
duro fardo em todos há
ninguém a si próprio basta
ou sábio assaz ficará.
Convem que nos toleremos
reciprocamente, oh sim
que uns aos outros ajudemos
consolando-nos enfim.
Que uns aos outros socorramos
e aconselhemos também:
Só na desdita mostramos
quanta nobreza a alma tem.
As ocasiões não trazem
coisas que abalem a fé
Forte a fraco elas não fazem,
mostram aquilo que é!
Affonso Celso
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